Artefatos de pedra e conchas de sambaquis têm entre 4 e 3
mil anos e contam a história de indígenas primitivos do Rio
de Janeiro
O sítio arqueológico do Matadouro Imperial, na região da
Leopoldina (Centro) onde hoje é área de estoque de aduelas
da Linha 4 do Metrô, revela mais tesouros da história do Rio
de Janeiro. A equipe de Arqueologia do Consórcio Linha 4 Sul
encontrou e está estudando cerca de 50 artefatos de pedra e
mais de 400 conchas característicos da Pré-História. São
peças de 4 a 3 mil anos atrás, do período quando os
paleo-indios, que circulavam pelas terras ao redor da Baía
de Guanabara, eram caçadores-pescadores, coletores e nômades
(e seminômades) - ainda não haviam formado tribos, como as
concebemos. As conchas, pontas de lança, batedores e
raspadores estão entre os mais de 220 mil artefatos
encontrados no sítio arqueológico da Leopoldina, que já
apresentou ao mundo objetos de uso cotidiano da Corte de Dom
Pedro II, como escovas de dentes, perfumes, remédios, louças
e até joias de ouro.
"As peças pré-históricas vão nos ajudar a contar uma parte
importante da história do processo populacional primitivo no
Rio de Janeiro. Deparar-se com uma descoberta destas no
Centro do Rio, uma área que já passou por vários ciclos de
ocupação e é tão movimentada, é algo fantástico. Além das
conchas de moluscos (mexilhões, mariscos e ostras), que
serviam de alimentação para estes grupos, encontramos as
lanças de caça, os raspadores usados para cortar a carne do
animal e separar gordura e couro, machadinhas e batedores
(que funcionavam como martelos primitivos) para retirar as
lascas de um núcleo de pedra sílex, quartzo e diabásio e
afiar os instrumentos", afirma o arqueólogo Claudio Prado de
Mello, coordenador da equipe de Arqueologia contratada pelo
Consórcio Linha 4 Sul para fazer escavações arqueológicas
nas áreas de obra na Leopoldina, Ipanema e Leblon durante a
construção da Linha 4 do Metrô.
Uma curiosidade desta descoberta do período Pré-Histórico é
que as peças estavam misturadas à chamada “camada histórica”
– o material foi achado de 30 cm até 120 cm de profundidade
-, o que não é comum. Normalmente, estariam na parte mais
profunda da escavação, que em algumas partes chegou até
2,50m de profundidade. Claudio trabalha com a forte hipótese
de que uma pequena elevação (morrote) que existia próxima ao
Matadouro Imperial tivesse restos de um sambaqui.
Sambaquis
Sambaquis são amontoados de conchas e outros resíduos
acumulados por ação humana, encontrados comumente em área de
litoral recortado, com baías, mangues, enseadas e restingas.
Eles podem chegar a ter 30m de altura e formam o tipo de
sítio arqueológico típico de populações pré-históricas, de
grupos nômades e seminômades, que tinham sua vida cotidiana
ligada ao mangue, de onde tiravam sua subsistência (ostras,
peixes, siris, conchas bivalves). Os sambaquis não eram a
moradia destes grupos, mas o local onde eram depositados as
sobras de alimentação e os instrumentos obsoletos e também
serviam como sinalização de que aquela área era propícia
para a busca de alimentos. Podiam ser usados ainda como uma
espécie de "cemitério" dos grupos caçadores-pescadores e
coletores.
A área de São Cristovão tinha algumas elevações ou morros
que foram destruídos na chamada ‘Era das Demolições’ do Rio
de Janeiro, ocorrida principalmente de 1870 a 1920. O
morrote na Leopoldina aparece em uma foto-gravura de Victor
Frond, de 1862. Mas após a decisão do Governo Imperial de
transferir o Matadouro para Santa Cruz em 1881, o prédio
começou a ser demolido e as áreas no entorno, terraplanadas.
"Ao acharmos este material pré-histórico chegamos a pensar
que os artefatos poderiam ser da tribo de Arariboia (que
ficava bem ao lado do atual terreno da Leopoldina), mas para
isso, precisariam estar numa profundidade um pouco maior e
no fundo da camada de solo, coincidindo com a ocupação dos
índios Tememinos, que ocorreu nos anos 1570. Mas, à medida
em que fomos aprofundando a pesquisa do relevo da
Leopoldina, a pesquisa histórica e a análise estilística
(visual) das peças, concluímos que não estavam ligadas à
fase de contato entre indígenas e portugueses. São bem mais
antigas", explica o arqueólogo.
Sítio Arqueológico Matadouro Imperial
Empreendimento do Governo do Estado do Rio de Janeiro, toda
a obra da Linha 4 do Metrô é acompanhada por serviço
especializado de Arqueologia, contratado pelo Consórcio
Linha 4 Sul. No sítio arqueológico Matadouro Imperial, na
Lepoldina, foram encontradas mais de 220 mil peças, inteiras
ou fragmentadas. Neste local, onde hoje estão armazenadas as
aduelas que formam os túneis da Linha 4 entre Ipanema e
Gávea, funcionava o Matadouro Imperial e uma área de
descarte, próxima ao Palácio Imperial da Quinta da Boa
Vista. Ali foram recuperados artefatos que remontam ao Rio
de Janeiro dos séculos XVII, XVIII e XIX e também - como
sabemos agora - ao período Pré-histórico ou Pré-Colonial.
Um dos objetos mais impressionantes do Período Histórico
encontrados por Claudio e sua equipe foi uma escova de
dentes íntegra, em marfim, com a inscrição em francês: “S M
L’EMPEREUR DU BRESIL“ (Sua majestade, o imperador do
Brasil). Acredita-se que a escova tenha pertencido a Dom
Pedro II ou outro membro da família imperial, que vivia ali
perto, em São Cristóvão. Também foram achadas duas peças de
ouro, como um anel e alfinete de gravata tipo fíbula, além
de porcelanas, pratos, cachimbos e garrafas de vidro e
Stoneware (cerâmica alemã) - algumas inclusive com líquido
dentro, como perfumes e produtos químicos.
Todo o trabalho de Arqueologia na Linha 4 do Metrô é
coordenado pelo Governo do Estado e pelo Consórcio Linha 4
Sul e tem a fiscalização federal do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e municipal do
Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH). O sítio
arqueológico Matadouro Imperial foi aberto em meados de 2013
e, depois de quatro meses de escavação, foi coberto em
setembro com uma manta tecnológica, que preserva as
condições originais da escavação. Nestes últimos dois anos,
a equipe de Arqueologia tem se concentrado em identificar e
catalogar as centenas de milhares de peças encontradas.
Quando as obras da Linha 4 do Metrô terminarem, em 2016, o
sítio será novamente aberto, para novas pesquisas e coletas,
e os resultados finais desta pesquisa serão compartilhados
com o público.
Achados na Zona Sul
Em Ipanema e Leblon, a equipe de Arqueologia encontrou mais
de 1.400 fragmentos de alvenaria, enfeites de telhado,
balaustrados, peças de porcelana, pratos, tigelas, talheres,
moedas, vidro e até penicos, além de trechos do antigo
sistema de trilhos de bonde. Estes artefatos são parte da
história cotidiana das chácaras que ocupavam esta área da
Zona Sul do Rio de Janeiro, no século XIX e início do século
XX, antes do loteamento sistemático.
Mais de 300 mil pessoas devem usar a Linha 4 do Metrô
A Linha 4 do Metrô do Rio de Janeiro é uma obra do Governo
do Estado do Rio de Janeiro e vai transportar, a partir de
2016, mais de 300 mil pessoas por dia, retirando das ruas
cerca de 2 mil veículos por hora/pico. Serão seis estações e
aproximadamente 16 quilômetros de extensão. A ligação
metroviária entre Ipanema e Barra da Tijuca estará à
disposição dos passageiros em julho de 2016, com a operação
comercial da nova linha nos mesmos horários das demais
linhas do metrô. Será possível ir da Barra a Ipanema em 13
minutos e, da Barra ao Centro, em 34 minutos. Os usuários
poderão ainda deslocar-se da Pavuna até a Barra da Tijuca
pagando apenas uma tarifa.