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Letras | Cristina Lebre | Edição 180

Mariana x Paris - Gente, tragédia tem ego?

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Homens e animais mortos! O rio, que era doce, agora é amargo. A cidade-luz se transforma em trevas e banho de sangue. Os peixes falecem em um mar de lama que continua avançando, enquanto cidades somem do mapa ou estão em estado de calamidade. Como disse um amigo meu, “é impossível não comentar as duas tragédias”. Nenhuma intenção de comparar qual delas é a mais importante. As duas revelam os mais hediondos comportamentos humanos.

Onde há gente há problema. Não tem jeito. “Mariana” não é o nome de mais um furacão norte-americano, mas de uma catástrofe além-fronteiras. Desde o momento em que a barragem da Samarco Fundão se rompeu, um oceano de podridão vem se arrastando e comendo tudo o que há pela frente. Povoações, rios, campos estão, literalmente, na lama. Pessoas estão morrendo, animais não resistem, o meio ambiente chora. Nós choramos, e tememos pelo que ainda pode acontecer.

Em Paris o estrago é dramático. Não há palavras para descrever o que é aquele atentado à vida. E o mundo agora está em guerra declarada. Religiões e sistemas de governo se digladiam. Eu me pergunto “o que é o homem se não um monturo de inutilidade, de pura e inóspita vaidade?”.

“Misericórdia quero, e não holocaustos”, diz Jesus no Evangelho de Mateus, capítulo 9, versículo 13. Só este trecho me vem à mente, enquanto passo o fim de semana inteiro em frente à TV, ao computador e ao celular, tentando resgatar o máximo de informações possíveis a respeito dos dois infortúnios. E me deparo com uma disputa ferrenha sobre qual o acontecimento mais significativo. Ora, amigos, isso não é uma luta de UFC! Não há estrelas neste universo de trevas! O mundo escorre no limbo da soberba humana, e uma massa de gente que não tem o que fazer ainda fica batendo boca virtualmente acerca de quem mata mais, quem morre mais, o que é mais cataclísmico!

Basta de abobrinhas! Vamos aos fatos. Estamos todos ferrados, de uma ponta à outra do planeta, e ai das que “estão grávidas ou amamentando” nestes dias! O que interessa é divulgar, compartilhar, lutar, resistir, se aprofundar no combate ao mal que se espalha feito o lodo incessantemente escorrendo terras e rios abaixo em direção ao mar, ao mesmo tempo em que engole aglomerados urbanos e a natureza, sem escolher qual o primeiro, qual o último! Mister é usar todas as armas (pacíficas) possíveis, entre elas as redes sociais, para provar à morte que ainda estamos vivos, e que vamos continuar vivos queira ela ou não porque, ainda que esta víbora sorva uma geração, outra está chegando e a ela tragará!

É bem verdade que alguns veículos de comunicação priorizam, em seus tempos de notícias, uma desgraça, em detrimento da outra. E isso não é correto. Mais, é antiético, antissocial, anti - o direito da opinião pública à informação, ou seja, anti - tudo! Mas bolas, não precisamos apenas dos canais de TV, temos à nossa disposição uma gama infinita de fontes no mundo virtual. São sites, blogs, páginas, papers, artigos, pesquisas, o que a gente quiser! Onde clicarmos, ali haverá a referência que estamos procurando. Se é assim, pra quê discutir se Mariana é mais grave do que Paris, ou vice-versa?

Paris sempre será Paris, a cidade mais charmosa do mundo! Não há terrorismo que consiga apagar seu brilho. Em que pese o profundo lamento pelas famílias enlutadas, os jovens mortos são agora mártires dessa contenda insana deflagrada entre radicais islâmicos e ocidentais arrogantes. Pois quem sabe qual nasceu primeiro, o ovo ou a galinha? Quem atirou a primeira pedra? Quem começou a matar inocentes? O que será dos refugiados sírios tentando entrar em território europeu agora? Quem tem mais direito à vida? Quem disseminou o preconceito, senão o próprio ser humano, e desde que o mundo é mundo?

A patética realidade que vivemos, neste século cheio de tecnologia e nenhum respeito, nenhuma tolerância, é apenas, e não mais do que, o fétido resultado da prepotência do homem. E não vamos acabar aqui. Paris, Mariana, Chernobyl, Hiroshima, Palestina ou o Complexo de Manguinhos nada mais são do que cenários da barbárie humana. Porque tragédia não tem ego, mas este, às pessoas, é o que não falta! E mais do que super, padecemos do “over-ego” que assola as nações. Que venham mais notícias: infelizmente, estamos preparados para (quase) tudo!


 
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