Não é de minha
preferência falar de política nem me manifestar contra ou
pró quem quer que seja. Creio em Deus e sou jornalista,
poeta, mãe e avó. No mais, sou uma cidadã, até o momento,
consciente de meus deveres. Além disso, costumo ouvir meus
amigos estudiosos de ciências políticas buscando o
entendimento, entre outras coisas, do quanto é necessário
proceder a alianças entre partidos e ideologias para se
conseguir governar um país. Sempre fui de esquerda, embora
hoje, na verdade, o meu partido seja o ceticismo e a
decepção constante com a política brasileira.
Porém, não posso
deixar de manifestar o meu repúdio às mais recentes
declarações do ex-Presidente Lula fazendo apologia aos
políticos honestos (“por mais ladrões que eles sejam”) em
detrimento dos concursados deste país.
Em primeiro
lugar, como jornalista, escritora e revisora, não consigo
entender como é que uma profissão pode ser “a mais honesta
que existe, por mais ladrão que seja.” É um paradoxo sem
precedentes na história da Língua Portuguesa. Nem Aurélio
nem Houaiss saberiam explicar como é que uma pessoa consegue
ser honesta e ladra ao mesmo tempo. Pois se alguém é
honesto, não rouba, e se alguém rouba, não pode ser honesto.
Certo? Ou estou errada?
Em segundo lugar,
e isto é de uma gravidade extrema, o cidadão em questão não
conseguiu discernir a importância de sua estapafúrdia
declaração de que “quem faz concurso está com o emprego
garantido pro resto da vida.” Como ex-funcionária da Caixa
Econômica Federal, onde trabalhei por 21 anos, eu afirmo que
não está. Quem faz um concurso garante estabilidade no
emprego sim, mas isso está condicionado à sua permanente
integridade e idoneidade com relação ao interesse público.
Vi, nos anos em que fui escrituraria da Caixa, inúmeras
pessoas serem objetos de apuração sumária por terem desviado
recursos, vi mesmo pessoas serem demitidas por justa causa.
Pois que, quando se assina um contrato de trabalho em um
departamento público ou uma estatal, está prevista a
cláusula de justa causa, dentre outros motivos, para quem,
comprovadamente, desvia recursos que não são seus em
benefício próprio. Vi até gerentes serem presos por se
corromperem no decurso de suas missões. Portanto, ser
concursado não significa, em absoluto, estar com o emprego
garantido para o resto da vida. Não quer dizer que você pode
humilhar, ofender ou se apropriar do que não é seu. Há que
vigiar, e orar, para não se desviar do caminho reto.
Em terceiro
lugar, e o que avalio como o mais importante: as afirmações
do ex-presidente denotam a impulsividade de quem, para
contestar as acusações que pesam sobre si, achincalha uma
população que estuda e trabalha de sol a sol para conquistar
uma posição digna e colaborar com o país. Pois será que ele
não pensa que suas declarações estão influenciando toda uma
geração de jovens que o defendem? Como devemos educar nossos
filhos então? Dizendo a eles que estudar e cursar uma
universidade não tem a menor importância, nem muito menos
estudar para passar em um concurso público, e que muito mais
meritório é ser um “político que, por mais ladrão que seja,
tem de ir às ruas todo ano pedir seu emprego?” Então ele
admite que ser político é ter um emprego, e não prestar um
serviço ao país?
Sr.Presidente da
República Federativa do Brasil, o senhor não considera o
peso de suas palavras para toda uma geração de jovens que o
apoiam, e levantam a bandeira de seu partido?
Estamos aqui há
décadas trabalhando e estudando para criar nossos filhos e
netos com base em valores de honestidade e lisura. Não os
educamos para que, daqui a uns dias, meu neto venha me dizer
que ele não precisa estudar para passar em um concurso
público, basta ser político, pois eles é que são os mais
honestos, “por mais ladrões que sejam.”
Em memória do meu
pai, (nada a ver com os deputados na hora de votar o
impeachment da Presidenta Dilma, por favor) que veio do
interior da Bahia para o Rio de Janeiro estudar para ser
advogado e passar num concurso para o Banco do Brasil, eu
renego a assertiva do Sr. Lula em referência aos concursados.
Pelas minhas filhas e pelo meu neto, como cidadã e chefe de
família que sou há tantos anos, refuto a alegação de que os
concursados “estão com o emprego garantido para o resto da
vida.” Não estão. Muito pelo contrario, hoje em dia ninguém,
absolutamente ninguém, está tranquilo neste país de tantos
valores invertidos como o próprio presidente parece querer
pregar. Não criamos as futuras gerações brasileiras para
serem “políticos honestos, por mais ladrões que sejam.” Não
vivemos até aqui para ouvir tamanha ofensa e injúria aos
serviços que, arduamente, prestamos a essa (ainda) nação.
Que as pessoas
públicas pensem melhor antes de desdenharem classes sociais
trabalhadoras e honestas sem serem ladras, porque não
existem honestos ladrões. Que os políticos avaliem suas
palavras vãs que, no afã de se safarem de acusações que
pesam contra eles, vêm a público desfazer de toda uma
sociedade. Que o futuro de nosso país seja muito mais do que
a politicagem a que se tem assistido todos os dias, a fim de
que ainda haja esperança para quem chega agora e quer
trabalhar, honestamente, por toda aquela que perseveramos em
chamar de pátria.