Amigos, compartilho aqui com vocês o meu torpor diante do
que estamos vivendo em nossa cidade, no nosso triste estado
do Rio de Janeiro, em todo o nosso país. Parece que não
estamos propriamente vivendo, mas tentando sobreviver em
meio a um caos avançado, ainda que anunciado há tanto tempo.
Quando atingimos um patamar de maturidade, independente da
idade cronológica, o foco do pensamento deixa de ser
simplesmente o ego, mas se volta para o todo, o núcleo, o
cerne das questões mais significativas da vida, quais sejam,
a dignidade e o amor.
Não há mais espaço para o interesse apenas próprio, porque é
nítida a constatação de que o outro precisa estar bem para
que eu fique bem. Porque é intrínseca à noção de bem-estar a
certeza de que eu não posso usufruir o melhor da vida se o
meu vizinho de porta está morrendo, aos poucos, pelas dores
da injustiça e da maldade humana.
Porém, infelizmente, essa premissa não se revela a todos,
nem tampouco no nível satisfatório para que a comunidade
inteira se regozije, de forma igualitária, dos direitos que
todos, aí incluindo os animais, temos: o direito à
dignidade, ao respeito, à vida.
A fé e a religiosidade ajudam muito a gente a entender este
sentido. Contudo, muitas pessoas, mesmo sem crer em Deus,
vivem para o bem e para os valores que fazem de nós seres
capacitados a amar e dividir, a perdoar e procurar seguir
sempre o caminho da harmonia e da paz.
Ainda assim, é triste demais ver o caráter de desvio de
tantas pessoas, que se separam em raças, classes e níveis
culturais, pessoas que amam o dinheiro acima de todas as
coisas, e que se tornam completamente alheias ao interesse
geral, que pensam ser a felicidade delas o único valor
realmente importante e o principal.
Essas pessoas se enganam. Amontoam-se em guetos, de onde
pretendem gozar as benesses de uma zona de conforto jamais
ameaçada. Não conseguem ver que o seu próprio conforto não
pode existir sem o conforto do outro, e que a sua
felicidade, se condicionada à infelicidade do próximo, é
estopim para a revolta que se semeia no coração alheio, e
que fatalmente se colherá, da forma mais cruel possível, em
determinado momento.
Toda ação tem uma reação. Pensadores sabem e escrevem tudo
sobre tais fenômenos físicos e sociais. Entretanto, as
fraquezas inerentes ao homem dominam mentes iludidas por um
sofisma de felicidade que não considera o outro, antes pelo
contrário, depende conscientemente da desgraça alheia para
se sustentar em um pedestal, para eles, inalcançável.
É um engodo.
Natal é época de recesso dos cuidados com o mundo, mesmo
para os que não creem que aquele menino nascido em uma
estrebaria de um longínquo vilarejo da Judeia era o Messias,
e que na verdade não existe essa história de Messias.
De qualquer forma é tempo de frear. Tempo de parar, por
pouco que seja, de correr tanto. Tempo de descansar a mente
de tantas preocupações, de reunir-se em família, ainda que
ela tenha muitos problemas, tempo de abraçar, perdoar,
relevar, renovar promessas, pra si e para o outro.
Sendo assim, que a gente possa aproveitar esse tempo da
melhor forma, dando uma pausa do frenesi das redes sociais,
da urgência do check-in, e também da inveja, do
ressentimento, do desejo de vingança. Que a gente possa
tirar um intervalo do que é ruim e nos massacra todos os
dias, para ir ao encontro do que é o melhor. Porque o melhor
não está no mais caro, nem no mais esteticamente belo. O
melhor está no simples, em um passeio pela orla de mãos
dadas com o parceiro, com os filhos, em admirar a paisagem
que todos os dias se descortina aos nossos olhos. O mais
bonito está no respirar profundo e sentir a paz que o som
das ondas do mar reverberam. O melhor de tudo, neste Natal,
é parar. Sim, parar pra sentir. E sentir o gosto doce de um
sorriso puro.
O ano vindouro anuncia muitas e muitas lutas, homens
egoístas fervorosamente articulando num conluio da falsa
crença de sucesso e poder em detrimento do interesse lícito
de milhões e milhões de pessoas espalhadas por este vasto
território.
Que as pessoas de bem tenham forças pra lutar, mas com as
armas da justiça, não do ódio. Que a cidadania seja erguida
ao mais alto pódio do poder. Do verdadeiro poder, o que
emana do povo. E que nós tenhamos força e fé renovadas a
cada manhã para fertilizar, com muito trabalho e suor, a
vastidão deste solo tão ressequido pela ganância e cobiça
desmedidas.
Porém, até o primeiro dia útil de 2017, vamos parar. E
desfrutar dos momentos de recesso para descansar, corpo,
alma e espírito.
É verdade que a festa é mais sensível aos que creem no
Cristo que nasceu de uma virgem para anunciar a esperança e
o amor maior. Todavia, mesmo para quem não o crê, esta é a
mais deliciosa celebração do ano. Se não tanto pela família
reunida, que seja pela rabanada, mais gostosa ainda no café
da manhã do dia 25. Um Feliz Natal e um recesso renovador a
todos!!!!
Cristina Lebre é autora dos livros Olhos de Lince e Marca
d’Água – à venda nas Livrarias Gutenberg de Icaraí e São
Gonçalo, pelo portal da editora, www.biblioteca24horas.com,
ou diretamente pelo e-mail lebre.cristina@gmail.com.