Violência doméstica: a desconstrução de um tabu
A antiga ideia de que o delinquente era um estranho que se esconderia numa rua escura vem mudando sua face e, à luz, observam-se feições bastante familiares, uma violência muita das vezes silenciosa, que acomete mulheres, crianças e adolescentes, além de idosos, deficientes físicos e mentais. Tratam-se de atos violentos, que acontecem dentro dos lares, intrafamiliar, onde a taxa de homicídios é menor, mas o prejuízo individual, familiar e social é catastrófico.
Entende-se por violência intrafamiliar toda ação ou omissão que prejudique o bem-estar, a integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito ao pleno desenvolvimento de um membro da família. Pode ser cometida dentro e fora de casa, por qualquer integrante da família que esteja em relação de poder com a pessoa agredida. Inclui também as pessoas que estão exercendo a função de pai ou mãe, mesmo sem laços de sangue.
A hipótese de que o ambiente familiar, pelas ligações afetivas, protegeria seus membros mais vulneráveis, tem se mostrado bastante falha. A violência doméstica atinge todas as populações do mundo, independente de nível cultural, social e econômico. Existem quatro formas mais comuns de violência intrafamiliar: física, psicológica, por negligência e sexual.
A violência física ocorre quando alguém causa ou tenta causar dano por meio de força física, de algum tipo de arma ou instrumento que possa causar lesões internas, externas ou ambas. A violência psicológica inclui toda ação ou omissão que causa ou visa a causar dano à autoestima, à identidade ou ao desenvolvimento da pessoa. A negligência é a omissão de responsabilidade de um ou mais membros da família em relação a outro, sobretudo àqueles que precisam de ajuda por questões de idade ou alguma condição física, permanente ou temporária. A violência sexual é toda ação na qual uma pessoa, em situação de poder, obriga uma outra à realização de práticas sexuais, utilizando força física, influência psicológica ou uso de armas ou drogas.
Violência contra a mulher, que atualmente tem sido manchete nos principais veículos de comunicação do país, nos leva há uma reflexão: A violência aumentou? Ou será que as mulheres violentadas estão se sentindo mais seguras em denunciar os abusos sofridos?
As consequências negativas dessas agressões atingem principalmente as mulheres, na sua saúde física e emocional, comprometendo o bem-estar de seus filhos e de toda estrutura familiar. Esse impacto de tipos diferentes de violência ao longo do tempo torna-se cumulativo para algumas mulheres, o peso destas agressões e sua desesperança parecem tão intoleráveis que podem levá-las ao suicídio.
Outro fator alarmante é a violência contra o idoso, que na maioria das vezes é silenciosa aos olhos do poder público e da grande mídia.
O estado de vulnerabilidade em que se encontram, muitos idosos se sentem um “fardo” para seus familiares, submetem-se por culpa e por não ter como se proteger. Uma das violências mais comuns é a financeira, o uso das aposentadorias pela família e a desatenção das necessidades do idoso, culminando no abandono. Além de muitas outras, como maus-tratos físicos, estupro, maus cuidados de higiene, má nutrição, vestuário inadequado, escaras, impactação fecal.
O poder público em todas as suas esferas e principalmente na Municipal, pela sua proximidade com a população, tem um fator primordial na elaboração do estudo da violência doméstica que exige uma atitude de muita tolerância e sensibilidade.
“A evolução da vida moderna desencadeou muitas alterações que acabaram por fragilizar e isolar o núcleo familiar”
Essa abordagem sobre a violência doméstica necessita de muitas mãos. O apoio a “espaços transicionais”, como escolas, ainda hoje o maior ponto de amparo social da criança, pode aliviar o árido trabalho de acompanhar casos já de longa duração e péssimo prognóstico. São ainda os professores, apesar da grande falta de apoio, os que ainda mais detectam alterações e encaminham situações de suspeita. Uma equipe de saúde bem treinada pode detectar, documentar, abordar e acompanhar boa parte dos casos, porque a primeira reação da vítima é negar ou evitar, colaborando para o “muro de silêncio”, onde a violência não é mensurada
Para concluir, cabe-se ressaltar que a participação da sociedade civil organizada é de fundamental importância para minimizar os efeitos e as causas da violência doméstica, buscando junto ao poder público ações mais eficazes de combate e prevenção da violência doméstica.