Abastecimento de água na Região Metropolitana do Rio: sistema sem redundância
Por Miguel Fernández *
Sistemas fundamentais de infraestrutura, como o de abastecimento de água coletivo, devem ser projetados com redundâncias, em virtude do alto impacto social e econômico que geram quando são interrompidos. A redundância, nesse caso, significa manter sistemas duplicados ou triplicados para garantir a disponibilidade de processos e equipamentos críticos.
Nos últimos dias, grande parte da população do lado leste da Baía de Guanabara (Niterói, São Gonçalo, Itaboraí, parte de Maricá e Paquetá) teve o abastecimento de água interrompido em virtude do derramamento de um poluente tóxico no Rio Macacu, manancial do sistema Imunana-Laranjal.
Os procedimentos de contingenciamento dos órgãos envolvidos de rápida interrupção, contenção do despejo e limpeza, fizeram com que em poucos dias o sistema voltasse a operar, mitigando maiores impactos pelo prolongamento da paralisação do fornecimento de água para quase 2 milhões de pessoas. Mas como ficaria essa população se o problema ocorrido não fosse de “rápida recuperação”?
Quando se fala que algo é redundante, a interpretação direta pela palavra pode levar ao entendimento de que este seria excessivo, ou até desnecessário. Entretanto, na engenharia, sistemas que são essenciais e não podem parar, são desenvolvidos com múltiplas redundâncias, para reduzir ao máximo os riscos de falhas e aumentar a garantia da segurança operacional.
Assim devem ser os sistemas de abastecimento de água. Entretanto, não é o que existe na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, que possui dois grandes e antigos sistemas independentes. O risco que a Região Metropolitana vive hoje sob esse fato já é assunto presente no meio técnico do setor, pois sequer podem ser feitas as interrupções necessárias para manutenções preventivas periódicas completas.
O principal investimento em abastecimento de água que vem sendo proposto atualmente pela companhia concessionária do serviço (Cedae) é de implantar um Novo Guandu, isto é, uma segunda estação de tratamento de água próxima à existente com a mesma captação. Essa alternativa mitiga os riscos de interrupção de abastecimento quanto a falhas de operação na unidade de tratamento de água da Cedae, mas mantém e até amplia a interdependência dos riscos advindos do sistema de transposição Light Santa Cecília.
Para o lado leste da Baía de Guanabara, o sistema Imunana-Laranjal praticamente já extrapolou o seu limite de disponibilidade hídrica para o abastecimento. Apesar de existirem projetos para a região, como a implantação de barragens no rio Guapiaçu e adjacentes, tais soluções acabam se configurando como paliativas, pois praticamente não atenderiam às demandas atuais, já diagnosticadas como deficitárias.
Incidentes como esse que ocorreu na Grande Niterói devem ser vistos como alarmes para cenários mais críticos. Importantes investimentos precisam ser feitos na direção de ampliar a disponibilidade hídrica do lado leste da Baía de Guanabara e interligar os dois sistemas, garantindo redundância operacional.
* Miguel Fernández é engenheiro civil e presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (Crea-RJ)