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Uso de algemas em deportações gera críticas após anos de silêncio

Governo Lula reage à prática dos EUA, mas a ausência de medidas anteriores levanta questionamentos

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O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recebeu, entre 27 de janeiro de 2023 e 10 de janeiro de 2025, um total de 32 voos com 3.660 brasileiros deportados dos Estados Unidos, sob a administração do ex-presidente americano Joe Biden. As aeronaves pousaram no aeroporto de Confins (MG), seguindo o protocolo padrão norte-americano de transportar os deportados algemados e com os pés acorrentados.

No último sábado (25), com a chegada do primeiro voo de deportados após Donald Trump assumir a presidência dos EUA, o avião, por questões técnicas, aterrissou em Manaus. Na ocasião, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, que assumiu o cargo em fevereiro de 2024, ordenou a retirada imediata das algemas, criticando a prática como “desrespeito aos direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros”.

Padrão contestado apenas agora

Apesar da reação atual, o uso de algemas em voos de deportação já era de conhecimento público há anos. A prática, mantida durante o governo anterior e nos primeiros meses da gestão Lula, não obteve qualquer objeção formal até então. Desde que Lewandowski assumiu o Ministério da Justiça, 17 voos com deportados já chegaram ao Brasil, mas somente agora, com a ordem vinda do Governo Trump, o governo se posicionou contra o uso de algemas.

A Polícia Federal brasileira afirmou que, por norma, o uso de algemas é aplicado apenas em situações de risco à segurança. Entretanto, as autoridades americanas justificam a medida como necessária para evitar ataques à tripulação ou a outros passageiros.

Entendimento bilateral e contexto histórico

O Itamaraty destacou que os voos de deportação seguem um acordo firmado em 2017, durante a gestão de Michel Temer (MDB), que determina que brasileiros só sejam deportados após o esgotamento de todos os recursos legais. Mesmo assim, a conduta padrão de transportar deportados algemados persiste como parte dos protocolos estabelecidos pelo Departamento de Imigração e Fiscalização Aduaneira (ICE) dos Estados Unidos.

A deportação envolve um processo que começa com a prisão por contravenções, como infrações de trânsito ou crimes mais graves, como tráfico de drogas. Imigrantes com menos de dois anos nos EUA podem ser deportados sem necessidade de julgamento, enquanto os que residem há mais tempo enfrentam processos que podem durar anos. Após a decisão judicial, os deportados são enviados em aviões da ICE ou em aeronaves militares, levando apenas uma mochila de até 18 kg.

Reação do Governo Brasileiro

Em publicação oficial na rede social X, o governo brasileiro destacou que Lewandowski, informado pelo diretor da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, determinou que as algemas fossem retiradas em nome da soberania nacional e do respeito aos direitos humanos. “O Ministério da Justiça enfatiza que a dignidade da pessoa humana é um princípio basilar da Constituição Federal e inegociável”, afirmou a nota oficial.

Governo Biden e recorde de deportações

Segundo levantamento, o governo Biden deportou mais brasileiros do que as gestões de Donald Trump (2017-2020) e Barack Obama (2013-2016). Entre outubro de 2020 e setembro de 2024, 7.168 brasileiros foram deportados, representando 1,3% do total de deportados no período – percentual mais alto em comparação com os governos anteriores.

Apesar do volume menor de deportações gerais durante a administração Biden, a proporção de brasileiros deportados aumentou, indicando uma aplicação mais rigorosa contra essa nacionalidade.

Reflexão necessária sobre a omissão anterior

A reação tardia e questionável do governo Lula em contestar o uso de algemas contrasta com anos de silêncio sobre o tema. Enquanto a atual postura busca afirmar a soberania nacional e o respeito aos direitos fundamentais, é inegável que o assunto foi negligenciado por anos, em um momento onde os governos se alinhavam ideologicamente.

Uma resposta diplomática, mais consistente, transparente e imparcial, é fundamental para evitar que brasileiros em situação de vulnerabilidade sejam submetidos a condições que ferem sua dignidade, especialmente quando protocolos “desumanos” se tornam prática aceita sem contestação.

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